A defesa do presidente da República, Michel Temer, afirma, em 98 páginas e um anexo com 90 folhas, que não foi cometido crime algum. Segundo o documento, entregue nesta quarta-feira (5) à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), a denúncia do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, baseia-se em uma “peça de ficção”, contendo apenas hipóteses e suposições.
“O presidente da República não cometeu corrupção passiva, e eu lanço um desafio respeitoso aos acusadores para que demonstrem, por meio de um único indício que seja, por mais frágil que seja, que o presidente tenha pedido algo, tenha recebido algo ou favorecido alguém”, disse o advogado de Temer, Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, ao entregar o documento.
Com base em gravações e delação premiada dos irmãos Joesley e Wesley Batista, donos do grupo J&F – que controla o frigorífico JBS e outras empresas –, Janot denunciou Temer ao Supremo Tribunal Federal (STF) por crime de corrupção passiva. O procurador-geral analisa a possibilidade de oferecer outras denúncias, por obstrução da Justiça e organização criminosa.
A defesa de Michel Temer comenta uma sequência de fatos. Primeiro, destaca que a Procuradoria-Geral da República admitiu que a denúncia foi feita de modo imediato, para impedir que crimes continuassem a ser praticados. Depois, afirma que, ao pedir a autorização para o processo, o ministro Edson Fachin, responsável no STF pela Operação Lava Jato, ressaltou que ainda não há crime tipificado de forma categórica contra Temer. Por fim, coloca em questão a delação premiada dos irmãos Batista, por favorecer os acusadores.
O documento elaborado pelos advogados do presidente também caracteriza a denúncia como seletiva. Mariz de Oliveira disse que a peça acusatória desconsiderou depoimentos que constam dos relatórios da Polícia Federal e que seriam benéficos a Temer.
A defesa também justifica porque Temer não respondeu às perguntas feitas pela PF. Segundo o texto, as questões tinham um caráter “arrogante, evasivo, desrespeitoso, verdadeiro acinte à dignidade pessoal e ao cargo que [Temer] ocupa, além de atentar contra dispositivos legais”. Mariz de Oliveira salientou que, se as perguntas tivessem sido formuladas pelo ministro Fachin, teriam sido respondidas.
Resumo acessível
A defesa de Temer foi entregue à CCJ antes de exaurido todo o prazo regimental, de até dez sessões do Plenário. Segundo Mariz de Oliveira, um resumo será enviado a todos os deputados. Ele ressaltou que o documento, embora técnico, foi feito em linguagem acessível, para que todos compreendam.
O advogado de Temer afirmou que considera duvidosa a gravação de Joesley Batista. Segundo Mariz de Oliveira, é uma prova ilícita, porque a lei só admite a gravação para que o interlocutor se defenda mais adiante e, além disso, foi tecnicamente questionada por laudos particulares.
“Mesmo se for considerada boa, não traz um único elemento que ligue o presidente ao cometimento de um crime”, ressaltou o advogado.
Mariz de Oliveira disse ainda que Temer teve vários encontros noturnos e fora da agenda oficial – com empresários, lideranças e representantes de várias instituições. “Nada de estranho, nada que não pudesse entrar para o rol do que se considera normal.”
Testemunhas
Sobre a proposta de deputados oposicionistas de convidar Rodrigo Janot para explicar a denúncia, o advogado de Temer avalia disse que a CCJ não é local adequado, porque a análise no colegiado não se trata de um julgamento. O presidente da CCJ, deputado Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), ainda não anunciou uma decisão sobre o assunto, mas tem entendimento semelhante
Por outro lado, Mariz de Oliveira disse que gostaria de ter a oportunidade de confrontar Janot, de quem se considera amigo, sobre a denúncia. “Eu sou um homem do contraditório, eu quero fazer perguntas, estar vis-à-vis com aqueles que acusam o presidente”, afirmou. “Mas não sei se o momento é oportuno, se o âmbito é o correto”, acrescentou.
Tramitação
Cabe à CCJ instruir o assunto para análise do Plenário da Câmara. Nesta quarta-feira (5), o presidente da CCJ, deputado Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), reuniu os líderes dos partidos na comissão e juntos discutiram como será a tramitação da denúncia (SIP 1/17).
Pelo calendário da comissão, o relatório sobre a denúncia, a ser elaborado pelo deputado Sergio Zveiter (PMDB-RJ), deve ser lido na segunda-feira (10), também antes de atingido o prazo regimental de cinco sessões do Plenário. Após prazo de vista de duas sessões do Plenário, o início da discussão na CCJ está previsto para quarta-feira (12).
Segundo a Constituição, em caso da acusação por crime comum, como corrupção passiva, o julgamento do presidente da República cabe ao STF, mas o processo só pode ser aberto se houver autorização do Plenário da Câmara – é necessário o apoio de pelo menos dois terços dos parlamentares (342 votos).
Da Agência Brasil
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